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Dois


“Antes era a juventude e não havia dúvidas, os erros não pesavam e tudo nos era possível. Éramos predadores na selva e comíamos sem pensar no amanhã. Mas destruímos tudo o que tínhamos, terminávamos só comendo a fome e isso não nos bastava. No fim, a fome nos comeu.”

- Deixa eu te cheirar? - Que coisa doida é essa, hein? – risadas sinceras, sim, elas vinham como um soluço inesperado. - É sério! – Olho no olho, mesmo que dê errado, um sentimento de tudo ou nada paira no ar – Me deixa sentir esse cheiro que faz passagem no teu pescoço? Todo dia que a gente se abraça, o tempo parece uma eternidade, mas quando acaba eu percebo que foram dois segundos. - Sério? – As risadas sinceras se transformam em um único riso, tem forma e tem sentimento, tem dúvida, e apesar disso, tem carinho – Por quê? - Porque sei que amanhã, talvez, não irei mais sentir esta vontade e quero viver esta sensação como um sonho que a gente se lembra. Eu me esqueço da maioria dos meus sonhos e, os que me lembro, sei que vão estar comigo por toda a vida. E quero que seu cheiro paire na minha cabeça como um sonho que não me esquecerei. - Então vem... O cheiro vem como ele sonhou, da maneira exata que a imaginação pediu, parece aquele pôr do sol vivenciado três anos antes e nunca apagado da memória. Minutos ou segundos? Dessa vez a eternidade pareceu um pouco maior. - É tudo que ansiei que fosse. - Posso te contar um segredo? O coração vem e vai em ritmo sincero e sentindo a escalada de uma montanha íngreme. - Conta... - Queria saber que cheiro foi esse que entrou pelo teu nariz e que causou este sorriso ao fim do nosso abraço, nunca percebi que esse teu sorriso é sempre assim depois que a gente termina um abraço. Abraçar-te-ia mil vezes se pudesse. Sinto um arrependimento novo em meu coração, nunca senti isso. Um sorriso, um suspiro... Mais outro e outro. - Agora não quero que isso acabe. Não imaginei que fosse escutar o que acabou de sair da minha boca – segundos e dúvidas, a respiração acelera e a pergunta vem sem freios – Me deixa conhecer tua boca? Os lábios mordem e a sensação é palpável, quem visse de longe sentiria junto o frio embaixo dos umbigos e por trás das nucas. Eles vêm circulares e molhados, são lábios que se querem e o beijo é lento e forte, tem ritmo e cor, faz sentir-se em mãos que se tocam, em quadris que se conectam e em fios de cabelos entrecruzados. O beijo tem cor, tem som, é vermelho, é neon, é quente, é úmido, é atraente, faz gemer, faz molhar, ruborizar, salivar por dentro e por fora, entre a alma e o fim da calma. Um sorriso bobo e um lábio urrando baixinho, uma mão que aperta o outro, sem timidez sem receio, conecta o andar, sobe um querer, sobe um poder, uma vontade, uma explosão, é o sopro tem horas, mesmo sem as horas, são minutos, são segundos e o começo ou seria o fim do mundo. É o breu das horas, a safadeza de meia roupa, entre pernas e entre outras, um luar, outra, sem roupas e grama na pele, a vertical que pende para horizontal, tem faróis, tem um brilho feroz. E tudo acaba e depois que os olhos se cruzam e a respiração volta ao normal a realidade vem. Uma dúvida nas duas cabeças: - Porque não antes, porque agora?


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